22 de dez. de 2010

Minha Ana Cristina César


Há pouco, procurava no Facebook uma referência de Ana Cristina César, e inacreditavelmente, não encontrei nada. Inconformada, fui criar uma página para minha poetisa maldita preferida. Em minha pesquisa fui reencontrando pedacinhos de Ana pelo Google. E esperava encontrar, é claro, a história sobre seu lendário suicídio. Aquela que fez com que eu me interessasse por ela, a-deprimida-mais-dramática-da-história-da-literatura-contemporânea. Diz a lenda que Ana Cristina, após anos de análise, havia se jogado da janela de seu analista quando ele foi atender ao telefone. Achava essa história muito maluca, e me impressionava ainda mais como psicóloga! Imagina se um paciente meu se suicida da janela de meu consultório! Claro que achava muito estranha a parte que o analista atendia ao telefone durante a sessão. Isso não se faz... Mas em minha busca, acabei encontrando que, na verdade, Ana cometeu suicídio aos trinta e um anos, atirando-se pela janela do apartamento dos pais, no décimo terceiro andar de um edifício em Copacabana. Procurei em várias outras fontes, e lá estava: nada de analista. Tentei então, lembrar de onde eu havia tirado essa história. Desconfiando, é claro, de mim mesma, que sou cheia de inventar histórias, enxertando coisas de minha fantasia – sempre com mais uma pitada de drama – e depois já não sei mais de onde veio. E lembrei de uma amiga contando, exatamente essa história! A Mônica, que é “levemente neurótica” como eu, sempre incrementa as histórias com um rouge a mais. Eu topei o conto, e até então, era esse o imaginário que tinha de Ana Cristina, tão breve e definitiva. Tá certo que se jogar da janela do apartamento dos pais não é algo menos dramático. Mas aos poucos vou me dando conta de minhas próprias fantasias e de minhas verdades inventadas. E me tranqüilizo. Porque no fim, é sempre assim. O que é a verdade afinal de contas?

"Também eu saio à revelia
e procuro uma síntese nas demoras
cato obsessões com fria têmpera e digo
do coração: não soube
e digo da palavra: não digo (não posso ainda acreditar na vida)
e demito o verso como quem acena
e vivo como quem despede a raiva de ter visto" (Ana Crstina César)

19 de dez. de 2010

Amor


E essa outra vida misturada à minha me faz acreditar sem grandes sustos que o amor é possível de novo. E meu peito, onde às vezes ainda bate um coração de menina assustada, de repente é inundado por uma alegria macia. E eu estranhamente me sinto protegida. E me faz acordar à noite pra olhar mais um pouquinho, porque o tempo nunca é bastante. E me faz procurar aqueles olhos que tão logo se tornaram cúmplices do que há de melhor em mim e de tudo aquilo que me dói. E me faz pensar enquanto molho as plantas, enquanto estou sozinha no elevador, enquanto cozinho, enquanto leio um livro, e tenho que reler várias vezes a mesma frase, porque já estou lá, naquelas sardas, naqueles cachos, naquele colo morno, abrindo mais uma vez esse presente tão delicado que se chama amor.

20 de nov. de 2010

El Despertar - Alejandra Pizarnik



Señor
La jaula se ha vuelto pájaro
y se ha volado
y mi corazón está loco
porque aúlla a la muerte
y sonríe detrás del viento
a mis delirios

Qué haré con el miedo
Qué haré con el miedo

Ya no baila la luz en mi sonrisa
ni las estaciones queman palomas en mis ideas
Mis manos se han desnudado
y se han ido donde la muerte
enseña a vivir a los muertos

Señor
El aire me castiga el ser
Detrás del aire hay monstruos
que beben de mi sangre

Es el desastre
Es la hora del vacío no vacío
Es el instante de poner cerrojo a los labios
oír a los condenados gritar
contemplar a cada uno de mis nombres
ahorcados en la nada.

Señor
Tengo veinte años
También mis ojos tienen veinte años
y sin embargo no dicen nada

Señor
He consumado mi vida en un instante
La última inocencia estalló
Ahora es nunca o jamás
o simplemente fue

¿Cómo no me suicido frente a un espejo
y desaparezco para reaparecer en el mar
donde un gran barco me esperaría
con las luces encendidas?

¿Cómo no me extraigo las venas
y hago con ellas una escala
para huir al otro lado de la noche?

El principio ha dado a luz el final
Todo continuará igual
Las sonrisas gastadas
El interés interesado
Las preguntas de piedra en piedra
Las gesticulaciones que remedan amor
Todo continuará igual

Pero mis brazos insisten en abrazar al mundo
porque aún no les enseñaron
que ya es demasiado tarde

Señor
Arroja los féretros de mi sangre

Recuerdo mi niñez
cuando yo era una anciana
Las flores morían en mis manos
porque la danza salvaje de la alegría
les destruía el corazón

Recuerdo las negras mañanas de sol
cuando era niña
es decir ayer
es decir hace siglos

Señor
La jaula se ha vuelto pájaro
y ha devorado mis esperanzas

Señor
La jaula se ha vuelto pájaro
Qué haré con el miedo?

13 de set. de 2010

My Blueberry Nights



O filme “My Blueberry Nights” (traduzido aqui como “Um Beijo Roubado”) é um dos meus prediletos, daqueles que a gente sente sempre como se estivesse vendo pela primeira vez. Aliás, pra mim, arte é o que suscita novas intensidades em todos os encontros, como se todas as vezes fosse a primeira. O que torna esse filme tão referente e pessoal, parte de minha bricolagem existencial, uma obra de arte. Um delírio estético sem pretensões do diretor Wong kar-wai – chamado de cineasta oriental de alma americana após dirigir essa película. Na estréia de Norah Jones como atriz, a fragilidade da cantora é aproveitada de maneira primorosa em sua personagem, Elizabeth. Como Norah, vinda das artes musicais, adentrando o território, até onde sabemos, estranho do cinema, Elizabeth está completamente desterritorializada após ropimento com o namorado. Jude Law é o dolorido-encantador Jeremy, dono de um charmoso café em New York, acostumado a ouvir os desencontros amorosos de seus clientes. Ambos de coração partido, eles se conhecessem nesse café. Jeremy fica lá sempre à espera, e Elizabeth sai em uma viagem sem destino pelos EUA. Nessa jornada existencial, ela acaba encontrando uma série de personagens com suas fragilidades e diferentes formas de amar. São nesses encontros que Elizabeth vai se recompondo. E é na espera das cartas dela que Jeremy também vai se refazendo. A bárbara Natalie Portman e a arrebatadora Rachel Weisz são algumas das figuras muito humanas do filme. A trilha sonora é divina, com “Try a Little Tenderness”, na melhor interpretação de Otis Redding, músicas de Cat Power (aliás, a cantora da banda, Shan Marshall, faz uma ponta!), e é claro, Norah Jones. “My Blueberry Nights” é um singelo poema, uma pequena epifania. Imperdível.

7 de set. de 2010

Quando setembro chegar

Enfim, agosto se foi. Alguns agostos por dentro, mas sobrevive-se. Ou melhor, vive-se. Um pouco de melancolia ainda, tipo ressaca de intensidades. Ressonâncias. Mas vamos lá, descobrindo coisas pequenas e doces, amores diários, cores no fim de tarde, esperanças amarelas.